quarta-feira, 26 de novembro de 2014

Relação entre identidade negra e religiões de matriz africana

A identificação das religiões afro-brasileiras com a identidade negra e a visão demoníaca da sociedade diante destas religiões




Ritual de iniciação de filhas de santo, Salvador, 1951. Fotografia de José Medeiros.

NASCIMENTO, Alessandra Amaral Soares. Candomblé e Umbanda: Práticas religiosas da identidade negra no Brasil. RBSE, 9 (27): 923 a 944. ISSN 1676-8965, dezembro de 2010.

O candomblé, umbanda e demais religiões afro-brasileiras são sempre associadas aos negros. Não conseguimos pensar nelas (estas religiões) de forma separada, sem assimilá-las automaticamente aos negros, e isso acontece de tal forma que até em uma cidade como Salvador, que a presença destas religiões e demais influencias cultuais africanas é tão presente, pensar em uma pessoa, não necessariamente branca, mas “não negra” como praticante desta religiosidade soa estranho. 
Mas é preciso ressaltar que esta religião não é exclusivamente negra. No mundo atual, a participação diversificada neste cultos tem crescido, o que facilita não só a quebra deste paradigma como também uma melhor compreensão sobre como essa religião é em sua essência.
Esta ligação tão forte está relacionada a sua origem histórica. Dentro destas práticas religiosas a presença muito forte da resistência negra na época da escravidão, como forma de manter suas culturas e poder manter sua identidade num lugar que lhe foi forçado a catequização e o batismo por exemplo.
É importante lembrar que no começo dessas práticas no Brasil, como geralmente se mantinham dentro de senzalas, não havia muita interferência do lado de fora, então geralmente eram toleradas não só pelos donos de escravos como pela Igreja. Com o final da escravidão, que os negros foram libertos e passaram a morar em periferias e cortiços que sua religião ganhou uma maior visualização, elas foram transferidas para o ar livre e praticadas mais livremente.
Com a inquisição que elas receberam uma perseguição forte, suas manifestações religiosas como cultos de transe, presença de espíritos que possuíam os corpos dos fieis e em alguns casos sacrifícios de animais assustavam aqueles que não conheciam e foi estereotipada de “magia negra”. O fato destas religiões não se apresentarem voltadas para o maniqueísmo como as religiões cristãs também ajudava nesta demonização. As pessoas que praticavam tais cultos foram taxadas de ignorantes, pois eles seriam primitivos e atrasados. Como dito pela autora Alessandra Amaral Soares:
“Muitos negros foram perseguidos e condenados pela inquisição em suas visitações ao Brasil, que viam em seus transes uma demonstração de possessão do demoníaco, e nos rituais prática de bruxaria ou “magia negra” como se convencionou chamar dita magia feita para o mal.” (artigo Candomblé e Umbanda: Práticas religiosas da identidade negra no Brasil, p. 929 da Revista Brasileira de Sociologia da Emoção, Dez. 2010).
Hoje em dia essa visão ainda se perdura, apesar de felizmente estar enfraquecida pelos amparos legais e sociais de defesa a cultura e diversidade religiosa. Como o artigo 208 do Código Penal, que estipula pena de um mês a um ano a todo aquele que “escarnecer de alguém publicamente, por motivo de crença ou função religiosa; impedir ou perturbar cerimônia ou prática de culto religioso; vilipendiar publicamente ato ou objeto de culto religioso”; e a lei 10639/2003, que torna obrigatório o ensino da cultura e história afro-brasileira nas escolas públicas e privadas.
É preciso, portanto, desmistificar a ideia de que os rituais de destas práticas são de alguma forma malignos ou infernais. Ser diferente não quer dizer maligno, porque elas não trazem um maniqueísmo tão bem formado, como no caso das cristãs, são encaradas automaticamente como más. 

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